sexta-feira, 28 de abril de 2006

Noite

As nuvens começam a se carregar, mais lento se tornam seus movimentos.
Pela manhã o sol foi estupendo, não demorou para sair e nem pra se ir.

Ele caminhava lentamente pelas ruas, o seu andar parecia cansado, mas determinado como sempre.
As ruas estavam sujas, o ar mais poluído, o clima pesado, as pessoas com taquicardia, e com pressão baixa, apesar da alta pressão que são submetidas.
O olho do mundo observava, o esgoto entre e as ruas e a sujeira vazando das cabeças de alguns.
O caminhar ficou mais lento, ele chegou a entrada de uma espécie de beco, virou a direita, quase tropeçou em um saco de lixo, o cheiro era horrível, havia um animal morto dentro dele, tal cena o fez vomitar, ele prosseguiu logo depois beco adentro, estava mais curvado que o normal, seu liso cabelo, extremamente liso arrastava pela água que estava ali parada há tempos. No final do beco tinha uma coberta azul desgastada pendurada em cabos de antigas vassouras e em embaixo deste lugar quatro cachorrinhos recém-nascidos e dois gatos, um pouco mais ao lado dois potes com leite e um pouco de arroz, ao ameaçar entrar nesta quase cabana, um dos gatos pulou perto dos pequenos bichinhos, o outro saiu correndo na direção contraria.

Um trovão rompe o silêncio.
A chuva desaba.

Alguns momentos depois chega um homem bem velho, acompanhado pelo gato que correra.
- Quem tá ai?
O homem que estava agachado com um dos pequenos cachorros na palma da mão se levantou...
- Eu perguntei quem tá ai?
O homem coloca o cão no chão e vai na direção do velho homem, colocando em seu ombro a mão.
O velho retira a mão pesada do homem com rispidez e cai pela força utilizada e pela falta dela.
O homem o segura...
O velho se assusta, o gato mia.
A chuva não pára.
O homem abraça o velho.
O vento leva a coberta, os gatos correm, os filhotinhos começam a resmungar, e o velho aproveitando a chuva, deságua a chorar junto com a chuva no ombro do estranho homem, que ao perceber o que estava acontecendo, aperta os olhos como que segurando as lágrimas e eles assim ficaram.
O vento levou a chuva também embora, os dois continuaram abraçados. Os gatos retornam, o tempo continua a se abrir e a passar.
Os gatos bebem o leite, os pequeninos continuam a resmungando, a noite começa a chegar e os dois ainda estão imóveis.
A noite chega, o cheiro daquele animal morto é maior, chegando a ser quase insuportável.
O homem se levanta, delicadamente coloca o velho no chão, se aproxima dos animais e com sua grande e desproporcional boca começa a cantar. Os bichos aos poucos começam a se alegrar, é quase meia noite, estranhas pessoas caminham na rua, mas o homem deixou isso de lado pelo menos naquele momento e continuou a cantar, e a noite parou, parou para escutar.
O cheiro do animal morto aumentou exacerbadamente e todos trocaram de lugar.
O homem parou de cantar, se levantou e partiu na direção do sol que estava nascendo, com uma lágrima escondida em seu escondido rosto deixando para trás o corpo do velho ainda deitado.

Texto de 2004 com algumas alterações
Claudio Rosa

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